sexta-feira, 17 de novembro de 2023

MEDOS E ENCANTOS

 



 

Tenho medo daquilo que conheço, dos buracos por onde andei, dos passos e rastros deixados nos medos que descartei.

Que o mundo me livre dos que me encaram olho no olho, sei das insanidades que esse humano é capaz, tão voraz como uma formiga cortadeira, que encontra o mel mais doce no pé espinhento de uma roseira.

Vai devastar-me a vivacidade e sugar sem dó minhas defesas. Por isso o medo evidente dessa gente que bate frente a frente nos dias que se faz realidade.

Atrai-me o desconhecido, energias e emoções, deuses sacros e pagãos, credos e outras seitas onde deleitas a imaginação.

Atiça-me a verdade dos desejos ocultos na proporção exata do encanto, onde o espanto equivale a vontade de entender o incompreensível, a magia das artes abstratas que retrata com fidelidade a alquimia dos mistérios, tão gloriosos, quanto gozosos.

Tenho dedicado atenção as rezas e as manifestações em línguas por curiosidade minha. Isso é parte dos encantos que guardo em segredo sob sete chaves.

Aliás esse é outro atrativo, a mística do número sete e tudo ao seu entorno. Sete anos no Tibet, sete noites e sete dias, sete mares naveguei, sete vidas tem o gato, sete pragas do Egito, sete luas novas...E tudo que está escrito.

São encantos que eu carrego e neles eu acredito. Tenho receio de regras, imposição e castigo, tenho ficado em silêncio, bem mais do que eu preciso, tentando adentrar sozinho a sétima porta do paraíso.

Numa manhã de ontem, dia nublado e frio, ouvi o canto do galo demasiado tardio, arrepiou-me a epiderme o agouro desse episódio, espiei pela janela o que seria esse alerta, cheguei a sentir ódio do pobre da sentinela.

Perdeu a hora do tempo, e seu relógio atrasado, não foi capaz de acordar na hora do tempo marcado. Por instinto soltou um canto um tanto descompassado, talvez por medo até ser degolado.

Medos e encantos são da nossa marca raiz, importante é viver a vida como mestre e aprendiz. Respeitar nossos limites e avançar quando der, ser do nosso tempo atris e ator e se possível feliz...Quando puder.

 

José Regi  

 

 

segunda-feira, 23 de outubro de 2023

Incompreensão

 



 

Um alarido triste entre os viventes

Prenúncio de sofrimento abissal

Esse ar parado, quase atemporal

E essa vontade de chorar iminente

 

Decifras o silêncio dessa manhã cinza

Não compreendes a quietude da citara

O sabor amargo do café na xícara

E a dor da ausência que não cicatriza

 

Olhos distantes, lágrimas caídas 

Não há mensuras capaz de medir

A dor imposta por essa partida.

 

Chegas a duvidar da própria crença

Ante ao Tamanho desse encurtamento

E do vazio que agora se apresenta.

 

José Regi

sábado, 2 de setembro de 2023

Volúpia

 



 

Eu, que desejo

O néctar inebriante

Do teu beijo

E depois...

Lambuzar-me

No abuso desse

Louco imaginar

Quero tocá-la

E sentir na ponta dos dedos

Ao calor que emana

Dos teus confins...

Enfim me perder

Na sinuosidade

De tuas curvas,

Deslizar e cair

Na luxúria

E por fim

E morrer no teu gozo.

 

José Regi

 

 

quinta-feira, 10 de agosto de 2023

Poema para instante agora



 

No condicional...

Não tem que ser assim superficial

Essa aventura eventual

No tempo de um temporal

Que caiu no fim

Da tarde de ontem

 

No condicional...

Há que se ter o mergulho

No abissal sentido pleno

O respirar terra molhada

Dá sensação de estar aqui

Embora em viagem

Insólita ao seu interior.

 

No condicional...

Cada toque

Cada cheiro

Cada gosto

E em cada olhar

Um filtro maxificador

Para cada micro sentido

 

Ter no condicional,

Alegrias aleatórias

Sorrisos espontâneos

Sentir-se bem

Na simplicidade do instante

Ante a complexidade

Vital que faz a roda girar.

 

No condicional...

Regar as flores

Atenuar as dores

Sentir os sabores

Nos estertores da vida

Enquanto respira esperança

Aquela criança teimosa

De ontem.

 

José Regi

 

terça-feira, 25 de julho de 2023

Flores do Manacá

 



O manacá da serra

Que plantei na terra,

Do fundo do meu quintal,

Amanheceu sorrindo

De tão lindo

Que floresceu.

 

O perfume é outro lume

Tão igual nunca senti

Tem cheiro de esperança

Quebrando a realidade

Um diferencial

De tudo que já vivi.

 

Cores vivas

que encantam

Chamariz a bichos tantos...

Pássaros, abelhas, joaninhas

Pousam e enfeitiçam

Esse meu dês-pertencer

 

Esse meu desacreditar

Que esses olhos jardineiros

Colheram lá no terreiro

Nesse início de manhã

Nas flores do Manacá.

 

José Regi

 

  

sábado, 10 de junho de 2023

Nós dois

 



 

Eu e você, somos um,

Na fluidez desses delírios

Um mergulho sacana

Corpo e pele

Nosso prazer é colírio,

Verbo e carne profana

Somos mar em profusão

Na confusão de sentidos

Na chuva morna desse

Temporal de tesão...

 

É você,

Minha estrada sem rota

Curvas de perdição

Corpo suado na porta

Volúpia, erupção

Liquida e sedenta

Tateando oculta fonte

Paraíso adentras,

Delimita horizontes

 

É assim cascata

Quente de jorro farto

Entrega lasciva

Entrelaçar de corpos...

Fusão.

És calmaria e arrebentação

Toda forma de querer

És fogo

Paixão

Sob a égide

De Eros e Psyche.

 

José Regi

 

 

 

segunda-feira, 24 de abril de 2023

Braile

 

 



 

Cego,

Invento passos

Absorvo sabores

Tateio sentidos

Com a ponta da língua

 

Abarco

Teu corpo nos braços

Amasso,

Beijo e cheiro

Tua essência

 

Por inteiro,

Me entrego aos teus delírios

Te ofereço calafrios no pouso

Enquanto voas

Suave e saciado gozo.

 

José Regi

quinta-feira, 13 de abril de 2023

Tirando você, não tenho carências

 



Gosto da seda,

Na maciez dos seus lábios,

Gosto da sua ingênua sedução,

Seu olhar buscante,

A têz cheirando lascívia,

A terceira visão.

 

Gosto da entrega,

Onde você se esfrega em mim,

Do início sem fim

E se derrama sobre a cama...

 

Suas vestes de cetin,

Seu jeito,

Seu calor,

O aroma especifico,

Seu tesão,

Meu amor. 

 

José Regi

sexta-feira, 31 de março de 2023

Desagravo

 

 


 

Não tem como,

Ante aquele que feriu,

Não soltar o verbo...

E manda-lo a puta que o pariu!

 

A vida ensina perdoar

Que nós somos todos falhos.

Mas somos humanos porra!

Perdoar é o caralho!

 

Olho por olho e dente por dente

Pra essa gente brucutu.

E quem achar que é diferente...

Que vá tomar no cu.

 

Que direitos pensam ter

De achar que podem mais

Em pensar que liberdade

É ferir os seus iguais?

 

Minha língua tem veneno

Tão letal quanto cicuta.

Se não sabe respeitar

A frase é bem curta...

 

Puta que pariu,

Caralho...

Vai tomar no cu

Filho da puta!

 

José Regi

terça-feira, 21 de março de 2023

Kurumin

 



 

Eu sou um tanto de tantos,

Pouco, muitos, quase nada

Sou o sal do pranto

Que na ribeira deságua

Aquele barco singrante

Rumo ao mirante

Sou água do igapó

Na melodia da mata

Sou a nota dó

Ao sol que desata.

 

Quisera ser mais...

Que a música do vento

No templo aberto

Desse tempo fechado

A lâmina cega do machado

O golpe sem efeito do facão

Curupira, caipora,

Anhangá ou caiçara...

Proteção

O que vela,

Que zela e protege

O limite, a cerca

Mãe d’água e

A tabua de salvação.

 

Sou a lei da mata

Sou lenda, folclore

A estação que colore

A tarde que desce

Silente...

Sou índio

Nativo

Sou dono de nada

Sou a estrada

O buraco na via

Sou o que havia

Antes de você chegar

Pelo mar torrente...

Sou um tanto de tantos,

Pouco, muitos, quase nada...

Sou gente.

 

José Regi

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2023

Ofertório

 



 

 

Por hoje te ofereço

Esse meu jeito torto

Minha ignorância

Meu pouco saber

Minha mineirice

Minha verdade

Nua e crua

 

Te oferto o que juntei...

Um pouco de Nietzche

Uma dose de Maquiavel

Uma porção de Poe

Com pitadas de Neruda

E um pé de arruda

Que plantei no jardim

 

Ainda te ofereço meus medos

Meus credos pagãos

Meu corpo dormente

Os calos das mãos

Os pés descalços

E o corpo nu

 

Me ofereço assim

Sem vestimenta nobre

Em palavras desprovidas

De qualquer defesa

Me ofereço por completo

E inteireza

Desnudo de todo ter,

Mas certo de todo meu ser.  

 

José Regi


Ilustração-

Michael Alfano

terça-feira, 17 de janeiro de 2023

Sem sentido

 



 

A poema sem sentido

Não causa arrepio na pele.

Para sê-lo,

Há que haver um canal

Revolver a lama

A inquietação

Que cause por si só

O desejo de gritar.

 

De fazer mimica

Sozinho

De olhar para o nada

E imaginar

Em silêncio

Uma sensação

De alívio.

 

Uma quase morte

Num parto

A fórceps

Arrancando a dor

E dela um arremedo 

De vida.

 

Nesse sentido

Porém, palavras

Tem se afastado

Como pássaros ariscos.

 

As mãos rabiscam

Versetos desconexos,

Sem poesia

Quase sem sentido

Que a teimosia

Insiste em poetizar...

MEDOS E ENCANTOS

    Tenho medo daquilo que conheço, dos buracos por onde andei, dos passos e rastros deixados nos medos que descartei. Que o mundo me ...